Zbigniew Libera conversa com Priotr Rypson
Zbigniew Libera, Correction Devices: Lego Concentration Camp, 1996. 7 Box Lego Set, Edition of 3, Galleri Wang, Oslo, and Paulina Kolczynska Fine Arts, New York.
Priotr Rypson: Sua mais recente exposição [em 1996] no Centro de Arte Contemporânea de Varsóvia chama-se Correction Devices.
Zbigniew Libera: O título tem duplo sentido. Por um lado pode significar trabalho em/com dispositivos corretivos ou mecanismos já existentes; por outro, pode ser uma sugestâo para corrigir dispositivos já existentes. Refiro-me a mecanismos que utilizamos em nossa cultura para treinar padrões de comportamento necessários para que as pessoas ajam como cidadãos de uma sociedade contemporânea. A questão essencial nesse trabalho é que ele se realiza em objetos reais, que realmente existem. Compartilho o pensamento de Michel Foucault a respeito da sociedade e da cultura; o que sou, meu ego, é produto de determinado sistema e pode se expressar por meio dos dispositivos corretivos, mecanismos utilizados para treinar o ego (...)
P. Seriam, então, instrumentos de crítica?
Z. Não creio. Não considero meu trabalho com esses dispositivos uma crítica à sociedade ou ao sistema social. Acho que sâo meios para conseguir obter controle sobre aquilo que tem formado meu ego. A crítica também é um elemento desse sistema, desse método.
P. O senhor incluiu neste trabalho elementos ligados a modelos educacionais, ao problema de importar tecnologia ocidental, know-how, padrões de pensamento ocidentais?
Z. É claro, por isso usei o Lego. Quase tudo está presente nesse sistema. E na Polônia, um dos países que não colonizaram, mas que foi submetido a pressões colonizadoras, a racionalidade está associada à influência ocidental, à ordem teutônica, à força, à colonizaçâo alemã... colonizando extremos remotos da Europa. Mas quero colocar a questão - não pretendo controlar todos os pontos de vista do público. Há toda uma categoria de objetos surrealistas e é importante que eles levantem a maior controvérsia moral possível. Isso pode ser provocante do ponto de vista moral (...)
P. Muitos dos trabalhos nesta exposição dizem respeito a vários valores; por outro lado, também se referem a design. Eles me fazem lembrar da estratégia de trabalho usada por Toscani para a Benetton, que localiza os tabus culturais e projeta por meio deles determinados padrões e temas. Será que um supermercado seria um local mais apropriado do que uma galeria para exibir seus trabalhos?
Z. Esses trabalhos abordam em parte as coisas que conhecemos de um ponto de vista da vida "normal". Gostaria de poder dizer que essa realidade é o que pode ser comprado em uma loja. E isso é mais real do que a natureza. Sou a favor do uso de uma linguagem que seja dolorosamente comunicativa. Precisamos começar a pensar como produtores dessas mercadorias e isso é o que pretendo simular no nível estético. Portanto, preciso pensar como um designer e não como artista. Hoje o design cria estéticas muito mais fortes do que a arte. Várias funções sociais anteriormente desempenhadas pela arte hoje foram substituídas pelo design. O pacote torna-se o produto, as necessidades estéticas e o gosto são criados pelos designers.
P. Como diretor de arte de sua "própria empresa", o senhor empacota idéias?
Z. O que é relevante é o absurdo. Às vezes um absurdo doloroso. Ajo como se fosse um alto assalariado de uma empresa, onde sou um dos elementos de uma grande máquina, onde sou o condutor de tudo, reproduzindo a maneira como uma grande equipe atua. Se posso usar as peças do Lego para construir um campo de concentração, demonstro dessa maneira o absurdo de outros conjuntos - tão absurdos quanto o meu.
O trabalho do artista polonês Zbigniew Libera, Correction Devices: Lego Concentration Camp (1996), foi apresentado na XXIII Bienal de São Paulo.
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