segunda-feira, outubro 29, 2007

Consciência do Desassossego

"Que confusão é tudo! Como ver é melhor que pensar, e ler melhor que escrever! O que vejo, pode ser que me engane, porém não o julgo meu. O que leio, pode ser que me pese, mas não me perturba o tê-lo escrito. Como tudo dói se o pensamos como conscientes de pensar, como seres espirituais em quem se deu aquele segundo desdobramento da consciência pelo qual sabemos que sabemos!"

PESSOA, Fernando. Livro do Desassosssego. São Paulo: Companhia das Letras, 2006, p. 281.

quarta-feira, outubro 24, 2007

Estética & Política

"Se vocês forem em política assim como são em estética,
estamos feitos".

Caetano Veloso, ao ser vaiado pela platéia durante a apresentação de "É proibido proibir" no III Festival Internacional da Canção de 1967.

quinta-feira, outubro 18, 2007

terça-feira, outubro 16, 2007

Sociedade Insatisfeita

"A questão existencial da vida moderna pode assim ser resumida da seguinte maneira: como podemos transformar nossa contingência em nosso destino sem renunciar à liberdade, sem nos agarrar ao corrimão da necessidade ou do fado? Como poderemos traduzir o contexto social em nosso próprio contexto sem recair em experimentos que se mostraram fúteis ou fatais, em experimentos de engenharia social ou politica redentora?"

HELLER, Agnes e FERENC,Fehér. "Da satisfação numa sociedade insatisfeita". In: A condição política pós-moderna. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002. p. 35.

quinta-feira, setembro 13, 2007

Pensamento Alemão no Século 20

O Goethe-Institut convida para o ciclo de palestras

PENSAMENTO ALEMÃO NO SÉCULO XX
Grandes protagonistas e recepção no Brasil


A Alemanha encontra-se no centro da história do século XX, afirma o historiador inglês Eric Hobsbawm. Com razão, pois a Alemanha, como nenhum outro país europeu nesse século, produziu e sofreu momentos altos e baixos, no ponto de intersecção de processos históricos universais, acompanhados por pensadores extraordinários, que marcaram profundamente a história do pensamento e, à medida que articulavam situações fundamentais do homem moderno, projetavam teorias críticas da sociedade e formulavam utopias, tornaram-se conhecidos muito além do seu país. Eles devem ser medidos pela sua própria grandeza, pois, como Nietzsche escreveu, “esse é o trabalho peculiar de todo grande pensador: ser legislador da medida, moeda e peso das coisas.“

Esse é o ponto de partida deste ciclo de palestras. Ele reúne grandes intelectuais brasileiros, que lançam um olhar sobre onze pensadores de língua alemã do século XX: Carl Schmitt, Ernst Bloch, Hannah Arendt, Herbert Marcuse, Jürgen Habermas, Martin Heidegger, Max Weber, Niklas Luhmann, Sigmund Freud, Theodor W. Adorno e Walter Benjamin.

Os palestrantes –Carlos Eduardo Jordão Machado, Gabriel Cohn, Gilberto Bercovici, Isabel Loureiro, Jeanne Marie Gagnebin, Jorge de Almeida, Jorge Grespan, Marcos Nobre, Renato Mezan, Vladimir Safatle e Zeljko Loparic– apresentarão os perfis desses pensadores e falarão de sua importância na história do pensamento, sua recepção no Brasil e a continuação de suas teorias, críticas e utopias no pensamento brasileiro.

A escolha dos pensadores aqui enfocados baseou-se em critérios pragmáticos. Um segundo ciclo, a ser realizado futuramente, incluirá outros tantos grandes pensadores de língua alemã, entre eles Wittgenstein, Lukács, Horkheimer, Jaspers, Gadamer e Fromm.

O ciclo pretende contribuir para a atualidade e a capacidade orientadora de posições intelectuais num mundo cada vez mais complexo e confuso, atribuindo ao pensamento a qualidade formulada pelo Galileu de Brecht na peça homônima: “Pensar é um dos maiores prazeres da raça humana.“

A programação se estenderá até 26 de novembro, com entrada franca:

17 de setembro, 19h: Max Weber (1864-1920)
Palestra: A Ética do Capitalismo | Gabriel Cohn (USP)

24 de setembro, 19h: Martin Heidegger (1889-1976)
Palestra: Fundamentos da Existência | Zeljko Loparic (PUC-SP)

1º de outubro, 19h: Herbert Marcuse (1898-1979)
Palestra: Reificação da Sociedade e Unidimensionalidade do Homem – Herbert Marcuse e a Crítica da Sociedade Capitalista Avançada | Isabel Loureiro (Instituto Rosa Luxemburg Stiftung)

8 de outubro, 19h: Carl Schmitt (1888-1985)
Palestra: A Tentativa de Uma Revolução Conservadora | Gilberto Bercovici (USP / Mackenzie)

15 de outubro, 19h: Walter Benjamin (1892-1940)
Palestra: Estética e Experiência Histórica | Jeanne Marie Gagnebin (PUC-SP / Unicamp)

22 de outubro, 19h: Ernst Bloch (1885-1977)
Palestra: Do Espírito da Utopia ao Princípio Esperança | Carlos Eduardo Machado Jordão (Unesp)

29 de outubro, 19h: Hannah Arendt (1906-1975)
Palestra: A Banalidade do Mal | Jorge Grespan (USP)

5 de novembro, 19h: Sigmund Freud (1856-1939)
Palestra: O Domínio do Inconsciente | Renato Mezan (PUC-SP)

12 de novembro, 19h: Theodor W. Adorno (1903-1969)
Palestra: Não Existe Vida Correta na Falsa | Vladimir Safatle (USP)

19 de novembro, 19h: Niklas Luhmann (1927–1998)
Palestra: A Teoria dos Sistemas Sociais de Niklas Luhmann | Marcelo Neves (PUC-SP / IDP)

26 de novembro, 19h: Jürgen Habermas (*1929)
Palestra: A Teoria Social de Jürgen Habermas | Marcos Nobre (Unicamp)

Goethe-Institut São Paulo
Rua Lisboa, 974 – Pinheiros – 11 3088-4288

Um Sistema Visual Brasileiro?



O propósito do seminário é o de investigar as transformações ocorridas nas linguagens visuais do Brasil num horizonte histórico amplo; portanto sem se prender a perspectivas autorais ou a manifestações estilísticas, consideradas em si ou isoladamente. De modo análogo, considera-se a cultura como esfera de simbolização geral, em situação de interação com outros processos da vida social.

O projeto do seminário parte da hipótese de que as artes visuais brasileiras vêm a alcançar na década de 1950 um patamar inédito de aglutinação e longevidade das experiências artísticas, em contraposição a um quadro endêmico de ecletismo e volubilidade, consoante à tradição cultural das nações periféricas.

As correntes do abstracionismo geométrico funcionaram como o núcleo inicial de formação de um sistema visual brasileiro moderno. A unidade dialética das concepções distintas ou opostas de arte e cultura nasceu à luz da vontade comum de modernizar e desenvolver o país. E ela se transformou qualitativamente ao longo deste processo em consciência crescente da problemática do subdesenvolvimento, principalmente a partir do golpe militar de 1964.

Deste modo, o processo de crítica e transformação dos paradigmas visuais, que leva da fundação dos grupos Ruptura e Frente à constituição programática da arte concreta e da arte neoconcreta, ao longo da década de 1950, e na década de 1960, à Nova Figuração e à Nova Objetividade, como ainda até distintos movimentos artísticos na década de 1970, assinala a consolidação de uma “causalidade interna”, a duras penas delineada em meio aos avatares da história do país.

Noutras palavras, a chave de constituição da causalidade interna, mediante a qual, na definição Antonio Candido, a produção das obras é influenciada “não por modelos estrangeiros imediatos, mas por exemplos nacionais anteriores”, consiste na articulação entre as artes visuais e a consciência da problemática do subdesenvolvimento.

A tônica dominante se mostra bem outra desde o início da década de 1980. A tendência pró-capitalista predomina e permeia todos os setores da vida social e simbólica. A lógica deste ponto de vista é a de que não existe alternativa ao capitalismo e à “globalização”, ou a de que o “mercado” constitui a única realidade possível. Concomitantemente entraram em desuso as práticas de reflexão histórica. O fim do ciclo histórico da arte moderna ou das vanguardas, que no Brasil constituíram fenômenos tardios, vigentes até a década de 1970, foi acompanhado pelo fim da esfera simbólica e social da crítica.

Uma nova questão se delineia neste quadro, relativamente à perspectiva posta anteriormente, acerca da formação de um sistema visual brasileiro: como as esferas da cultura e das artes – que antes pareciam em rota de colisão com a modernização conservadora – vieram a ser abrangidas e incluídas nesta última?

Para ter acesso à programação do seminário clique no título deste post.

terça-feira, agosto 28, 2007

A Lua Negra


William Blake, Hecate, 1795, caneta e tinta com aquarela, 43 x 58 cm, Tate Gallery, Londres

segunda-feira, agosto 27, 2007

Homem Superior

A única atitude digna de um homem superior é o persistir tenaz de uma atividade que se reconhece inútil, o hábito de uma disciplina que se sabe estéril, e o uso fixo de normas de pensamento filosófico e metafísico cuja importância se sente ser nula.
PESSOA, Fernando. Livro do Desassossego. São Paulo: Companhia das Letras, 2006, p. 117.

Quem sou eu?


Giorgio de Chirico, A esfinge questionando Édipo, 1966.

“Quem sou eu? (...) Além de toda espécie de singularidades que reconheço em mim, de afinidades que sinto, de atrações que sofro, de acontecimentos que me ocorram e ocorram somente a mim, além da quantidade de movimentos que me vejo fazer, de emoções que somente eu experimento, esforço-me, em relação aos outros homens, por saber em que consiste, ou pelo menos se deve, essa minha diferenciação. Não será à medida exata que eu tomar consciência dela que poderei ficar sabendo o que vim fazer nesse mundo, e qual a mensagem ímpar de que sou portador, a ponto de só a minha cabeça poder responder por seu destino?”

André Breton, Nadja. São Paulo: Cosac & Naify, 2006.

quinta-feira, agosto 23, 2007

Silêncio


Henry Fuseli, Silêncio, 1799-1901, óleo sobre tela, 63,5 x 51,5 cm, Künsthaus, Zurique.

Sonhos de um Visionário

Das Schattenreich ist das Paradies des Phantasten.

KANT, Immanuel. "Träume eines Geistersehrs, erläutert durch Träume der Metaphysik". In: Immanuel Kant: Vorkritische Schriften bis 1768. Wiesbaden: Insel Verlag, 1998. p. 923.

O reino das sombras é o paraíso dos fantasistas.

KANT, Immanuel. "Sonhos de um visionário explicados por sonhos da metafísica". In: Escritos pré-críticos. São Paulo: Ed. Unesp, 2005, p. 143.

terça-feira, agosto 21, 2007

Things that might have been

Penso nas coisas que poderiam ter sido e não foram.
O tratado de mitologia saxônia que Beda não escreveu.
A obra inconcebível que a Dante foi dado entrever, talvez,
Já corrigido o último verso da Comédia.
A história sem a tarde da Cruz e sem a tarde da cicuta.
A história sem o rosto de Helena.
O homem sem os olhos, que nos depararam a lua.
Nas três jornadas de Gettysburg, a vitória do Sul.
O amor que não compartilhamos.
O dilatado império que os Vikings não quiseram fundar.
O orbe sem a roda ou sem a rosa.
O juízo de John Donne sobre Shakespeare.
O outro corno do Unicórnio.
A ave fabulosa da Irlanda, que está em dois lugares a um só tempo.
O filho que não tive.

BORGES, Jorge Luis. "Things that might have been", História da Noite, Obras completas III. São Paulo: Globo, 1999, p. 207.

sexta-feira, agosto 17, 2007

As Formas Literárias da Filosofia

Por Jeanne Marie Gagnebin

A imagem da literatura como sendo uma linguagem bela, mas vazia, que precisa de "recheio filosófico" para não se reduzir a uma brincadeira tão graciosa quanto fútil, tem seu oposto simétrico numa representação da filosofia como "pura" atividade intelectual, séria, profunda, complicada e incompreensível para o comum dos mortais (que, aliás, passa muito bem sem ela, o que torna questionável sua reiterada importância). Nesta estranha atividade, reservada a poucos, a comunicabilidade não importa tanto. Até no próprio meio filosófico, por exemplo na academia, reina certa desconfiança em relação aos aspectos formais mais apurados de uma palestra oral ou de um texto escrito de filosofia. Geralmente, estes aspectos são vistos como concessões ao público, ornamentos estilísticos prescindíveis, ou, ainda, como algo meramente metafórico ou meramente retórico. Ora, a afirmação implícita da existência de uma dimensão "meramente metafórica" ou "meramente retórica" repousa numa concepção acrítica, dogmática e mesmo trivial das relações entre pensamento e linguagem: como se o pensamento se elaborasse a si mesmo numa altivez soberana sem o tatear na temporalidade das palavras que, no entanto, o constitui. Dito de maneira mais simples: a concepção da literatura como algo belo, mas ornamental, superficial, supérfluo, e a concepção da filosofia como algo verdadeiro, mas difícil, incompreensível e profundo, esses dois clichês complementares perpetuam, no mais das vezes, privilégios estabelecidos e territórios de poder no interior de uma partilha, social e historicamente constituída, entre vários tipos de saber. Assim, os escritores e os poetas poderiam se dedicar ao sucesso e ao entretenimento, enquanto os filósofos continuariam aureolados pela busca desinteressada da verdade.

Na introdução ao livro citado no início deste artigo [As formas literárias da filosofia], Gottfried Gabriel afirma que a filosofia, desde seu nascimento, oscila entre duas formas de saber/sabedoria, entre a Dichtung (a criação poética no sentido amplo) e a Wissenschaft, a ciência no sentido mais rigoroso. No decorrer de sua história, podemos, então, observar um movimento pendular: quanto se aproxima demais da poesia, a filosofia envereda novamente para o lado da ciência -- e quando esta última ameaça abocanhá-la, ela se volta novamente para uma dimensão de sabedoria mais poética. Esta observação tem o mérito de apontar para o estatuto ambíguo da atividade filosófica, desde seu início grego. Marcel Détienne lembra que a figura do filósofo é uma formação híbrida oriunda da tradição religiosa da sabedoria, em particular do pitagorismo, e, simultaneamente, da afirmação, na polis democrática, da dignidade e do poder da palavra racional -- logos -- e da autonomia da organização política. Esta ambigüidade também pode ser vista como fonte de riqueza; ela perdura até hoje, sob configurações e refigurações históricas diversas.
GAGNEBIN, Jeanne Marie. "As formas literárias da filosofia," in: Lembrar escrever esquecer. São Paulo: Ed. 34, 2006. pp. 201 e seguintes.

segunda-feira, agosto 13, 2007

Pequenos Passos

Para Cláudia Campos

Pas a pas
Nulle part
Nul seul
Ne sait comment
Petits pas
Nulle part
Obstinément

Passo a passo
Em parte alguma
Ninguém só
Sabe como
Pequenos passos
Em parte alguma
Obstinadamente

Poema de Samuel Beckett
dedicado a Herbert Marcuse
em seu 80º aniversário.

Correspondência Rosemont/Marcuse


April 16, 1973 envelope from Franklin Rosemont, in Herbert's papers, Frankfurt/Main City Library

Para saber mais a respeito, clique no título deste post.

Marcuse Surrealista?





Para ler na íntegra o texto assinado por Franklin Rosemont, e publicado em Arsenal 4, em 1989, clique no título deste post.

sexta-feira, agosto 10, 2007

O Newton de Blake


William Blake, Isaac Newton, 1795, 46x60 cm, Tate Gallery, Londres

terça-feira, agosto 07, 2007

No Centro do Tempo

14 de Maio de 1905
Há um lugar em que o tempo fica parado. Pingos de chuva permanecem inertes no ar. Pêndulos de relógios estacionam no meio de seu ciclo. Caẽs empinam seus focinhos em uivos silenciosos. Pedestres estão congelados em ruas poeirentas, suas pernas erguidas como se amarradas por cordas. Os aromas de tâmaras, mangas, coentro, cominho estão suspensos no ar.

À medida que um viajante se aproxima deste lugar, vindo de qualquer parte, ele anda cada vez mais devagar. As batidas do seu coração ficam cada vez mais espaçadas, sua respiração arrefece, sua temperatura cai, seus pensamentos diminuem, até que ele atinge o centro morto e pára. Pois este é o centro do tempo. A partir deste lugar, o tempo se distancia em círculos concêntricos -- inerte no centro, lentamente ganhando velocidade à proporção que aumenta o diâmetro.

Quem faria uma peregrinação ao centro do tempo? Pais com seus filhos, e amantes.

E assim, no lugar onde o tempo fica parado, vêem-se pais agarrados a seus filhos, em um abraço petrificado que nunca se desfará. A linda filhinha de olhos azuis e cabelos loiros nunca parará de sorrir o sorriso que está sorrindo agora, nunca perderá este brilho róseo de suas bochechas, nunca ficará enrugada nem cansada, nunca se ferirá, nunca desaprenderá o que seus pais lhe ensinaram, nunca pensará pensamentos que seus pais desconheçam, nunca tomará contato com o mal, nunca dirá a seus pais que não os ama, nunca deixará seu quarto com vista para o mar, nunca deixará de tocar seus pais como está tocando agora.

E, no lugar onde o tempo fica parado, vêem-se amantes beijando nas sombras dos prédios, em um abraço petrificado que nunca se desfará. O amado nunca tirará os braços de onde estão agora, nunca devolverá o bracelete de memórias, nunca viajará para longe da pessoa amada, nunca se sacrificará expondo-se a perigos, nunca deixará de mostrar seu amor, nunca sentirá ciúmes, nunca se apaixonará por outra pessoa, nunca perderá a paixão que existe neste instante do tempo.

É importante considerar que estas estátuas são iluminadas apenas por uma brandíssima luz vermelha, pois a luz fica reduzida a quase nada no centro do tempo, suas vibrações reduzidas a ecos em vastos desfiladeiros, sua intensidade diminuída ao bilho tênue dos vaga-lumes.

Aqueles que não estão exatamente no centro morto de fato se movem, mas no ritmo das geleiras. Uma escovadela no cabelo pode levar um ano, um beijo pode levar mil anos. Enquanto um sorriso é retribuído, estações passam pelo mundo exterior. Enquanto uma criança é abraçada, pontes são contruídas. Enquanto uma pessoa diz adeus, cidades desmoronam e são esquecidas.

E aqueles que regressam ao mundo exterior... Crianças crescem rapidamente, esquecem o abraço de séculos de seus pais, que para elas durou não mais que alguns segundos. Crianças tornam-se adultos, vivem separadas dos pais, vivem em suas próprias casas, desenvolvem seus próprias maneiras de fazer as coisas, sentem dor, envelhecem. Crianças maldizem os pais por tentarem segurá-las para sempre, maldizem o tempo pelas rugas em suas próprias peles e vozes ásperas. Essas crianças agora envelhecidas também querem parar o tempo mas em um outro momento. Querem congelar seus próprios filhos no centro do tempo.

Amantes que regressam descobrem que os amigos partiram muito tempo antes. Afinal, vidas se passaram. Eles transitam em um mundo que não reconhecem. Amantes que regressam ainda se abraçam nas sombras dos prédios, mas agora seus abraços parecem vazios e solitários. Logo esquecem as promessas feitas para durar séculos, que para eles duraram apenas segundos. Sentem ciúmes mesmo entre estranhos, falam coisas terríveis entre si, perdem a paixão, distanciam-se, envelhecem e se isolam em um mundo que não conhecem.

Alguns dizem que não se deve chegar perto do centro do tempo. A vida é um barco de tristeza, mas é nobre viver a vida, e sem tempo não há vida. Outros discordam. Prefeririam viver uma eternidade de felicidade, mesmo que essa eternidade fosse fixa e petrificada, como uma borboleta instalada em uma redoma.

LIGHTMAN, Alan. Sonhos de Einstein. São Paulo: Companhia das Letras, 2005. pp. 67-71.

segunda-feira, agosto 06, 2007

O Sublime -- Caspar David Friedrich


Caspar David Friedrich, Monge no mar, 1809, óleo sobre tela, 110x172 cm, Nationalgalerie, Berlim


Caspar David Friedrich, Nuvens, c. 1820, óleo sobre tela, 18,3x24,5 cm, Kusthalle, Hamburgo


Caspar David Friedrich, Fim de tarde, 1827, Kunsthalle, Manheim


Caspar David Friedrich, Vista do Báltico, 1820-25, óleo sobre tela, Museum Kunst Palast, Düsseldorf.


Caspar David Friedrich, Árvore de corvos, c. 1822, óleo sobre tela, 59x73 cm, Museu do Louvre, Paris.


Caspar David Friedrich, Homem e mulher contemplando a lua, 1824, óleo sobre tela, 34x44 cm, Nationalgalerie, Berlim


Caspar David Friedrich, O peregrino sobre o mar de brumas, 1817-18, óleo sobre tela, 94,8x74,8 cm, Kunsthalle, Hamburgo

"A teoria do sublime do século XVIII se desenvolveu como parte do movimento tanto de autonomização das diversas artes, como também do sistema das artes (a Estética) com relação aos demais sistemas (político, religioso e moral). Esse conceito estabeleceu-se de modo paralelo a um conceito forte de imaginação. O indivíduo do romantismo do final do século XVIII e início do XIX estava plenamente familiarizado com a estética do sublime. Para se convencer desse fato, basta lembrarmos aqui as telas de um Kaspar David Friedrich que tematizam o incomensurável -- montanhas, planícies e o oceano."

SILVA, Márcio-Seligmann. "Do delicioso horror sublime ao abjeto e à escritura do corpo" in: O local da diferença: ensaios sobre memória, arte, literatura e tradução. São Paulo: Ed. 34, 2005, p. 39.