"O homem rico, dedicado ao ócio e que, mesmo aparentando indiferença, não tem outra ocupação que a de correr no encalço da felicidade; o homem criado no luxo e acostumado, desde a juventude, a ser obedecido, aquele, enfim, que não tem outra profissão que não a da elegância, gozará sempre, em todas as épocas, de uma fisionomia diferente, inteiramente à parte.
(...)
Esses seres não têm outra ocupação a não ser a de cultivar a ideia do belo em sua pessoa, de satisfazer as suas paixões, de sentir e de pensar. Dispõem, assim, a seu bel-prazer e em grande quantidade, de tempo e dinheiro, sem os quais a fantasia, reduzida ao estado de devaneio passageiro, dificilmente pode ser traduzida em ação. É, infelizmente, bem verdade, que, sem tempo livre e sem dinheiro, o amor não passa de uma orgia de plebeu ou do cumprimento de um dever conjugal. Torna-se, em vez da atração ardente ou plena da fantasia, uma repugnante utilidade.
Se falo do amor a propósito do dandismo, é porque o amor é a ocupação natural dos que se dedicam ao ócio. Mas o dândi não visa o amor como objetivo especial. Se falei de dinheiro, é porque o dinheiro é indispensável às pessoas que fazem de suas paixões um culto; mas o dândi não aspira ao dinheiro como a algo essencial; um crédito ilimitado é o bastante; ele deixa essa grosseira paixão aos vulgares mortais. O dandismo não é nem mesmo, como muitas pessoas pouco sensatas parecem acreditar, um gosto imoderado pela toalete e pela elegância material. Essas coisas não são para o perfeito dândi, senão o símbolo da superioridade aristocrática do seu espírito."
Charles Baudelaire. O pintor da vida moderna.
(Belo Horizonte, Autêntica, 2010, p. 62-63).
2 comentários:
Descrição perfeita do que flana sobre os planos e pesos, flutuando na linguagem sem medida
O personagem Brás Cubas, de Machado de Assis, seria um paralelo aos dandis de Baudelaire?
Postar um comentário