terça-feira, dezembro 16, 2008
A Constelação do Sonho em BH
Imagem ao fundo: cena do sonho criada por Salvador Dalí para o filme Spellbound (Quando fala o coração), 1945. Dir.: Alfred Hitchcock.
Clique na imagem para ampliar.
quinta-feira, dezembro 11, 2008
A vida como ela é...
"Alguém dirá que A vida como ela é... insiste na tristeza e na abjeção. Talvez, e daí? O homem é triste e repito: -- triste do berço ao túmulo, triste da primeira à última lágrima. Nada soa mais falso do que a alegria. Rir num mundo miserável como o nosso é o mesmo que, em pleno velório, acender o cigarro na chama de um círio. Pode-se dizer que é triste A vida como ela é... -- porque o homem morre. Que importa tudo o mais, se a morte nos espera em qualquer esquina? Convém não esquecer que o homem é, ao mesmo tempo, o seu próprio cadáver. Hora após hora, dia após dia, ele amadurece para morrer. Há gêneros alegres, eu sei. Fala-se em 'teatro para fazer rir'. Mas uma peça que tenha essa destinação específica é tão absurda, obscena, como o seria uma missa cômica. Agora o aspecto da sordidez. Nas abjeções humanas, há ainda a marca da morte. Sim, o homem é sórdido porque morre. No seu ressentimento contra a morte, faz a própria vida com excremento e sangue."
Nelson Rodrigues. Elas gostam de apanhar. Rio de Janeiro: Agir, 2007, p. 7.
Nelson Rodrigues. Elas gostam de apanhar. Rio de Janeiro: Agir, 2007, p. 7.
domingo, dezembro 07, 2008
Pensar filosoficamente
"Pensar filosoficamente é como que pensar por intermitências, ser perturbado por aquilo que o pensamento não é. A força do pensar é a força da resistência contra o previamente pensado."
Theodor Adorno e Max Horkheimer. A dialética do esclarecimento. Rio de Janeiro, Jorge Zahar, 1985, p. 186.
Theodor Adorno e Max Horkheimer. A dialética do esclarecimento. Rio de Janeiro, Jorge Zahar, 1985, p. 186.
quinta-feira, novembro 27, 2008
sábado, novembro 22, 2008
Olhares
"Eis a grande arma da coqueteria virtuosa. Podemos tudo falar com um olhar e, entretanto, sempre podemos negar um olhar, pois ele não pode ser repetido textualmente."
Stendhal, "Os olhares". In: Do amor. Porto Alegre: L&PM, 2007, p. 59.
Stendhal, "Os olhares". In: Do amor. Porto Alegre: L&PM, 2007, p. 59.
quinta-feira, novembro 20, 2008
Paraísos Perdidos
terça-feira, novembro 18, 2008
Televisão, por Nelson Rodrigues
quinta-feira, novembro 13, 2008
Sobre a leitura e os livros
Francisco Goya, Caprichos (39), 1799.
"Quando lemos, outra pessoa pensa por nós: apenas repetimos seu processo mental, do mesmo modo que um estudante, ao aprender a escrever, refaz apenas os traços que seu professor faz a lápis.Quando lemos, somos dispensados em grande parte do trabalho de pensar. É por isso que sentimos um alívio ao passarmos da ocupação com nossos próprios pensamentos para a leitura. No entanto, a nossa cabeça é, durante a leitura, apenas uma arena de pensamentos alheios. Quando eles se retiram, o que resta? Em conseqüência disso, quem lê muito e quase o dia todo, mas nos intervalos passa o tempo sem pensar nada, perde gradativamente a capacidade de pensar por si mesmo -- como alguém que, de tanto cavalgar, acabasse desaprendendo a andar. Mas este é o caso de muitos eruditos: leram até ficarem burros. Pois a leitura contínua, retomada de imediato a cada momento livre, imobiliza o espírito mais do que o trabalho manual contínuo, já que é possível entregar-se a seus próprios pensamentos durante esse trabalho. Assim como uma mola acaba perdendo sua elasticidade pela pressão incessante de outro corpo, o espírito perde a sua pela imposição constante de pensamentos alheios. E, assim como o excesso de alimentação faz mal ao estômago e dessa maneira acaba afetando o corpo todo, também é possível, com excesso de alimento espiritual, sobrecarregar e sufocar o espírito. Pois, quanto mais se lê, menor a quantidade de marcas deixadas no espírito pelo que foi lido: ele se torna como um quadro com muitas coisas escritas sobre as outras. Com isso não se chega à ruminação: mas é só por meio dela que nos apropriamos do que foi lido, assim como as refeições não nos alimentam quando comemos, e sim quando digerimos. Em contrapartida, se alguém lê continuamente, sem parar para pensar, o que foi lido não cria raízes e se perde em grande parte. Em todo caso, com o alimento espiritual ocorre a mesma coisa que com o corporal: só a qüinquagéssima parte do que alguém absorve é assimilada, o resto se perde pela transpiração, respiração e, assim por diante. Além de tudo, os pensamentos postos em papel não passam, em geral, de um vestígio deixado na areia por um passante: vê-se bem o caminho que ele tomou, mas para saber o que ele viu durante o caminho é preciso usar os próprio olhos".
Arthur Schopenhauer.A arte de escrever. Porto Alegre: L&PM, 2008, pp. 127-129.
sábado, novembro 08, 2008
Pensando o Impensável: Heidegger
BBC Documentary, Human All Too Human, Heidegger: Thinking the Unthinkable, Part I.
Apoteose do Absurdo
Absurdemos a vida, de leste a oeste.
Fernando Pessoa, O livro do desassossego.
(São Paulo, Companhia de Bolso, 2006, p. 345.)
Fernando Pessoa, O livro do desassossego.
(São Paulo, Companhia de Bolso, 2006, p. 345.)
sexta-feira, novembro 07, 2008
Exquisite Grotesque
sexta-feira, outubro 31, 2008
Aprender a rir
quarta-feira, outubro 29, 2008
O dionisíaco segundo Nietzsche
Caravaggio, Bacchus, 1596
"A moral não seria uma 'vontade de negação da vida', um instinto secreto de aniquilamento, um princípio de decadência, apequenamento, difamação, um começo do fim? E, em consequência, o perigo dos perigos?... Contra a moral, portanto, voltou-se então, com este livro problemático, o meu instinto, como um instinto em prol da vida, e inventou para si, fundamentalmente, uma contradoutrina e uma contravaloração da vida, puramente artística, anticristã. Como denominá-la? Na qualidade de filólogo e homem das palavras eu a batizei, não sem alguma liberdade, com o nome de um deus grego: eu a chamei dionisíaca."
Friedrich Nietzsche, O nascimento da tragédia. (São Paulo, Companhia das Letras, 1998, p. 20).
segunda-feira, outubro 27, 2008
Falar, por Fernando Pessoa
Falar é ter demasiada consideração pelos outros.
Pela boca morrem o peixe e Oscar Wilde.
Fernando Pessoa, O livro do desassossego.
(São Paulo: Companhia de Bolso, 2006, p. 424).
Pela boca morrem o peixe e Oscar Wilde.
Fernando Pessoa, O livro do desassossego.
(São Paulo: Companhia de Bolso, 2006, p. 424).
quarta-feira, outubro 22, 2008
segunda-feira, outubro 20, 2008
Werther, o amante trágico
Johann Heinrich Wilhelm Tischbein, Goethe, 1786/88.
"Desgraçado! Não serás um louco? Não te enganarás a ti próprio? O que é que esperas dessa paixão frenética e infinita? Não tenho mais outro culto que não ela; a minha imaginação apenas me mostra a sua fisionomia e, de tudo o que me rodeia no mundo, apenas distingo aquilo que com ela se relaciona. E isso me causa algumas horas de felicidade... até que de novo sou obrigado a fugir dela. Oh, Guilherme! Até onde o coração me leva!"
GOETHE, Johann Wolfgang. O sofrimento do jovem Werther. (Porto Alegre: L&PM, 2008, p. 85).
terça-feira, outubro 14, 2008
Insatisfação Administrada
Mc Marianne, em intervenção do grupo ativista The Yes Men.
Em novo livro, o professor de filosofia Vladimir Safatle discute como o cinismo é um antídoto à falência da crítica
O cinismo passa a ser compreendido como categoria maior para a análise das dinâmicas de racionalização em operação nas múltiplas esferas de interação social no capitalismo contemporâneo. Por que em seu entendimento trata-se de um termo adequado para um diagnóstico da modernidade?
Safatle: Há uma história intrincada de transformação da crítica cínica ao convencionalismo da moral (sentido do cinismo grego) em dispositivo de conservação de valores que estão reconhecidamente em crise (sentido do cinismo contemporâneo).
Tentei descrever este processo através do comentário de um texto fundamental para entender esta passagem, “O Sobrinho de Rameau”, de Diderot, juntamente com a interpretação feita por Hegel, na “Fenomenologia do Espírito”. Uma leitura detalhada desse texto central para a constituição da crítica no Iluminismo nos permite ter uma compreensão mais precisa do que vem a ser atualmente “cinismo”. Neste ponto, não faço mais que caminhar em um caminho aberto por Rubens Rodrigues Torres Filho e Paulo Arantes.
Este esclarecimento conceitual parece-me importante, porque o termo é usado de maneira bastante livre na linguagem cotidiana. No entanto, ele descreve uma operação precisa. Creio que podemos dizer: cínico é todo enunciado que faz com que valores, princípios e critérios normativos intersubjetivamente partilhados consigam, paradoxalmente, justificar situações que lhes seriam contrárias. Neste sentido, o cinismo é uma espécie de distorção performativa capaz de torcer, de inverter os valores ao aplicá-los. A análise desta inversão, diga-se de passagem, é um fenômeno maior no interior daquilo que poderíamos chamar de auto-crítica da modernidade.
Para ler a íntegra da entrevista originalmente publicada em Trópico, clique no título deste post.
segunda-feira, setembro 29, 2008
Arte, exercício experimental da liberdade
sexta-feira, setembro 26, 2008
O que os olhos vêem...
quinta-feira, setembro 25, 2008
terça-feira, setembro 23, 2008
segunda-feira, setembro 22, 2008
Saramago assiste Ensaio sobre a cegueira
"Fernando, estou tão feliz por ter assistido a este filme, como estava quando terminei de escrever o livro."
José Saramago, logo após ter visto a versão cinematográfica de seu Ensaio sobre a cegueira, estrelada por Julianne Moore e dirigida pelo brasileiro Fernando Meirelles.
quinta-feira, setembro 18, 2008
quarta-feira, setembro 17, 2008
O grito do Laocoonte
Grupo de Laocoonte, Vaticano.
"O mestre [autor do Laocoonte] visava à suprema beleza sob as condições aceitas da dor corporal. Esta, em toda a sua violência desfiguradora, era incompatível com aquela. Ele foi obrigado a reduzi-la; ele foi obrigado a suavizar o grito em suspiro; não porque o grito denuncia uma alma indigna, mas antes porque ele dispõe a face de um modo asqueroso. Pois, em pensamentos, abra-se a boca do Laocoonte e julguemos. Deixemos que grite e olhemos. Era uma construção que suscitava a compaixão porque mostrava ao mesmo tempo beleza e dor; agora é uma construção feia, repugnante, da qual desviamos de bom grado a nossa face, porque a visão da dor excita desprazer, sem que a beleza do objeto que sofre possa transformar esse desprazer no sentimento doce da compaixão.
Esse simples largo abrir a boca -- pondo-se de lado o quanto as demais partes da face assim são deformadas e desordenadas de modo violento e asqueroso -- na pintura é uma mancha e na escultura uma cavidade que gera os efeitos mais desagradáveis do mundo."
LESSING, Gotthold Ephraim. Laocoonte ou sobre as fronteiras da pintura e da poesia. São Paulo: Iluminuras, 1998, p. 92.
Manifesto Dogma 95
Dogville (2003) de Lars von Trier, um dos criadores do Dogma 95.
As regras do Dogma 95, também conhecidas como “voto de castidade”, são:
1. As filmagens devem ser feitas em locais externos. Não podem ser usados acessórios ou cenografia (se a trama requer um acessório particular, deve-se escolher um ambiente externo onde ele se encontre).
2. O som não deve jamais ser produzido separadamente da imagem ou vice-versa. (A música não poderá ser utilizada a menos que ressoe no local onde se filma a cena).
3. A câmera deve ser usada na mão. São consentidos todos os movimentos - ou a imobilidade - devidos aos movimentos do corpo. (O filme não deve ser feito onde a câmera está colocada; são as tomadas que devem desenvolver-se onde o filme tem lugar).
4. O filme deve ser em cores. Não se aceita nenhuma iluminação especial. (Se há muito pouca luz, a cena deve ser cortada, ou então, pode-se colocar uma única lâmpada sobre a câmera).
5. São proibidos os truques fotográficos e filtros.
6. O filme não deve conter nenhuma ação "superficial". (Homicídios, Armas, etc. não podem ocorrer).
7. São vetados os deslocamentos temporais ou geográficos. (O filme se desenvolve em tempo real).
8. São inaceitáveis os filmes de gênero.
9. O filme deve ser em 35 mm, padrão.
10. O nome do diretor não deve figurar nos créditos.
O Manifesto Dogma 95 foi escrito para a criação de um cinema mais realista e menos comercial. Posteriormente juntaram-se a eles dois conterrâneos, os também cineastas Søren Kragh-Jacobsen e Kristian Levring. Segundo os cineastas, trata-se de um ato de resgate do cinema como feito antes da exploração industrial (segundo o modelo de Hollywood). O manifesto tem cunho técnico — apresenta uma série de restrições quanto ao uso de técnicas e tecnologias nos filmes — e ético — com regras quanto ao conteúdo dos filmes e seus diretores —, e suas idéias são tão controversas quanto seus filmes.
Todos os filmes que recebem o reconhecimento do Dogma 95 seguem 10 regras estipuladas por Trier e Vinterberg. Para tanto, os realizadores devem enviar cópias de seus filmes à entidade que gerencia o Dogma 95 e submetê-los à avaliação. Caso aprovado e verificado que o voto de castidade foi cumprido, os autores recebem o Certificado Dogma 95.
terça-feira, setembro 16, 2008
segunda-feira, setembro 15, 2008
domingo, setembro 14, 2008
quinta-feira, setembro 11, 2008
terça-feira, setembro 09, 2008
A Política da Literatura, por Jacques Rancière
Em seu livro “Politique de la Littérature” (Política da literatura), o sr. escreve : “A expressão ‘política da literatura’ implica que a literatura faz política enquanto literatura”. Como a política da literatura se distingue do engajamento propriamente dito?
Jacques Rancière: A política da literatura se diferencia do engajamento dos escritores a serviço de uma causa e da interpretação que suas ficções podem dar das estruturas sociais e dos conflitos políticos. A política da literatura supõe que a literatura aja não propagando idéias ou representações, mas criando um novo tipo de “senso comum”, reconfigurando as formas do visível comum e as relações entre visibilidade e significações. Esta política é, pois, consubstancial a um estatuto da escritura, a seu modo de se posicionar, à forma de experiência sensível que ela relata, ao tipo de mundo comum que ela constrói com os que a lêem.
Essas questões não podem ser colocadas independentemente da questão da historicidade da literatura. A literatura, pois, não é um conceito trans-histórico reunindo todas as formas da arte de falar e de escrever desde o começo dos tempos. É um conceito que não tem mais que 200 anos. No século XVIII, a palavra “literatura” designava a prática do erudito, e não a arte dos escritores.
A noção moderna de literatura como prática da arte de escrever nasceu ao mesmo tempo que os conceitos modernos de arte e de estética, na época das revoluções democráticas da América e da França. A literatura é, assim, um regime da escritura que rompe com o universo hierarquizado das Belas Letras: nesse universo, os gêneros eram hierarquizados segundo a dignidade de seus temas, isto é, dos personagens que representavam; a poesia era definida antes de tudo como uma ação. A ação, como encadeamento de efeitos a partir de fins perseguidos, definia o universo dos indivíduos nobres, capazes de perseguir tais fins, por oposição à vida repetitiva das pessoas comuns. Enfim, a escritura era subordinada a um modelo de excelência que era o da palavra viva, isto é, da palavra daqueles que são capazes de fazer acontecer algo apenas pela palavra.
Tudo isso definia uma relação estreita entre as regras da excelência poética e o “gosto” de uma sociedade aristocrática. A literatura significa a ruína desse sistema: todos os temas são, a partir de então, susceptíveis de serem considerados poéticos, toda vida é digna de ser escrita; não há mais princípio de correspondência entra a dignidade dos personagens e a qualidade de expressão. A palavra oral perde sua função de norma em benefício do livro escrito, que se dirige a qualquer um ao acaso e não mais a um público escolhido.
Nesse sentido, a literatura põe em prática a democracia da letra errante denunciada por Platão: a palavra que vai falar a qualquer um, não controlando seu trajeto e não selecionando seus destinatários. A democracia literária faz qualquer pessoa sentir formas de sentimento e de expressão reservadas às pessoas escolhidas. Ela contribui, assim, a uma democracia, que é a da circulação e da apropriação aleatória das formas de vida e de experiência vivida, das maneiras de falar, de sentir e de desejar.
Esta democratização é própria à literatura como tal, ela é independente das idéias políticas dos escritores. Estes descrevem de bom grado as agruras que sucedem às pessoas do povo quando se põem a ler romances. Mas os romances nos quais eles o fazem amplificam mais ainda esta oferta generalizada de formas de vida e de modos de sentir.
Texto publicado originalmente em Trópico. Para ler a entrevista na íntegra, clique no título deste post.
Jacques Rancière: A política da literatura se diferencia do engajamento dos escritores a serviço de uma causa e da interpretação que suas ficções podem dar das estruturas sociais e dos conflitos políticos. A política da literatura supõe que a literatura aja não propagando idéias ou representações, mas criando um novo tipo de “senso comum”, reconfigurando as formas do visível comum e as relações entre visibilidade e significações. Esta política é, pois, consubstancial a um estatuto da escritura, a seu modo de se posicionar, à forma de experiência sensível que ela relata, ao tipo de mundo comum que ela constrói com os que a lêem.
Essas questões não podem ser colocadas independentemente da questão da historicidade da literatura. A literatura, pois, não é um conceito trans-histórico reunindo todas as formas da arte de falar e de escrever desde o começo dos tempos. É um conceito que não tem mais que 200 anos. No século XVIII, a palavra “literatura” designava a prática do erudito, e não a arte dos escritores.
A noção moderna de literatura como prática da arte de escrever nasceu ao mesmo tempo que os conceitos modernos de arte e de estética, na época das revoluções democráticas da América e da França. A literatura é, assim, um regime da escritura que rompe com o universo hierarquizado das Belas Letras: nesse universo, os gêneros eram hierarquizados segundo a dignidade de seus temas, isto é, dos personagens que representavam; a poesia era definida antes de tudo como uma ação. A ação, como encadeamento de efeitos a partir de fins perseguidos, definia o universo dos indivíduos nobres, capazes de perseguir tais fins, por oposição à vida repetitiva das pessoas comuns. Enfim, a escritura era subordinada a um modelo de excelência que era o da palavra viva, isto é, da palavra daqueles que são capazes de fazer acontecer algo apenas pela palavra.
Tudo isso definia uma relação estreita entre as regras da excelência poética e o “gosto” de uma sociedade aristocrática. A literatura significa a ruína desse sistema: todos os temas são, a partir de então, susceptíveis de serem considerados poéticos, toda vida é digna de ser escrita; não há mais princípio de correspondência entra a dignidade dos personagens e a qualidade de expressão. A palavra oral perde sua função de norma em benefício do livro escrito, que se dirige a qualquer um ao acaso e não mais a um público escolhido.
Nesse sentido, a literatura põe em prática a democracia da letra errante denunciada por Platão: a palavra que vai falar a qualquer um, não controlando seu trajeto e não selecionando seus destinatários. A democracia literária faz qualquer pessoa sentir formas de sentimento e de expressão reservadas às pessoas escolhidas. Ela contribui, assim, a uma democracia, que é a da circulação e da apropriação aleatória das formas de vida e de experiência vivida, das maneiras de falar, de sentir e de desejar.
Esta democratização é própria à literatura como tal, ela é independente das idéias políticas dos escritores. Estes descrevem de bom grado as agruras que sucedem às pessoas do povo quando se põem a ler romances. Mas os romances nos quais eles o fazem amplificam mais ainda esta oferta generalizada de formas de vida e de modos de sentir.
Texto publicado originalmente em Trópico. Para ler a entrevista na íntegra, clique no título deste post.
segunda-feira, setembro 08, 2008
Sobre o filme argentino La Antena
La Antena (2007) recria a estética vintage do cinema silencioso, numa criativa metáfora do seqüestro do discurso pelos dispositivos normalizadores do "pensamento único" e suas figuras. No filme, há diversas referências a grandes cults do cinema como Metropolis (1927), Spellbound (1945) e Viagem à lua (1902), do mestre George Mèliés. Até por isso, vale conferir a interessante película dirigida pelo argentino Esteban Sapir.
quinta-feira, setembro 04, 2008
segunda-feira, setembro 01, 2008
Ponderación Misteriosa
segunda-feira, agosto 25, 2008
A arte conserva os perceptos e afectos
Odilon Redon, Flores, 1903, Óleo sobre tela, 66 x 54.5 cm, Kunstmuseum St. Gallen, Suiça.
"O que se conserva, a coisa ou obra de arte, é um bloco de sensações, isto é, um composto de perceptos e afectos. Os perceptos não são mais percepções, são independentes do estado daqueles que os experimentam; os afetos não são mais sentimentos ou afecções, transbordam a força daqueles que são atravessados por eles. As sensações, perceptos e afectos, são seres que valem por si mesmos e excedem qualquer vivido. Existem na ausência do homem, podemos dizer, porque o homem, tal como ele é fixado na pedra, sobre a tela ou ao longo das palavras, é ele próprio um composto de perceptos e afectos. A obra de arte é um ser de sensação, e nada mais: ela existe em si."
DELEUZE, Gilles e GUATTARI, Félix. O que é a filosofia? São Paulo: Ed. 34, 2005, p. 213.
segunda-feira, agosto 18, 2008
Contradigo-me?
sexta-feira, agosto 08, 2008
Caosmose Esquizo
Arthur Bispo do Rosário, Macumba.
"A 'normalidade', sob a luz do delírio, a lógica tecnicista, sob a lei do processo primário freudiano, um pas de deux em direção ao caos para tentar circunscrever uma subjetividade longe dos equilíbrios dominantes, para captar suas linhas virtuais de singularidade, de emergência e de renovação: eterno retorno dionisíaco ou paradoxal revolução copernicana que se prolongaria em uma reviravolta animista? No mínimo, fantasma originário de uma modernidade incessantemente posta em questão e sem esperança de remissão pós-moderna. Sempre a mesma aporia: a loucura cercada em sua estranheza, reificada para sempre em uma alteridade, não deixa de habitar nossa apreensão comum, sem qualidade, no mundo. Mas seria necessário ir ainda mais longe: a vertigem caótica, que encontra uma de suas expressões privilegiadas na loucura, é constitutiva da intencionalidade fundadora da relação sujeito-objeto. A psicose revela um motor essencial do ser no mundo".
GUATTARI, Félix. Caosmose: um novo paradigma estético. São Paulo: Ed. 34, 1992, p. 99
sábado, agosto 02, 2008
Os Gêmeos, São Paulo, Brasil
sexta-feira, agosto 01, 2008
quinta-feira, julho 31, 2008
Maio de 68, por Cohn-Bendit, Wolinski, Siné et ali
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